King Crimson - Eyes Wide Open - Progbrasil

King Crimson

Inglaterra
http://www.king-crimson.com/




Titulo: Eyes Wide Open
Ano de Lançamento: 2003
Genero:
Label:
Numero de catalogo: 3056

Revisto por Gibran Felippe em 24/01/10 Nota: 9.5

 

Obra-prima, irretocável

Obra-prima, irretocávell.

Excelente vídeo de dois shows antológicos da última formação do King Crimson. O primeiro ocorreu em 2003 no Japão referente à turnê do 'The Power To Believe' e o segundo em 2000 pela temporada do 'The Construcktion Of Light', realizado em Londres. A formação é exatamente a mesma em ambos: Robert Fripp - guitarras, Adrian Belew - guitarra e vocal, Trey Gunn - baixo e Pat Mastelotto - bateria.

A grande virtude dessa obra reside no fato de apresentar os eventos praticamente na íntegra, já que os shows possuem duração acima dos noventa minutos, fato raro na maioria das edições em dvd que insistem em suprimir sequencias inteiras das apresentações, para desgosto dos consumidores mais exigentes. Não se pode dizer que no Japão a casa estava cheia, porque definitivamente notava-se vários claros na platéia, mas a aura ritualística para uma apresentação do King Crimson estava no ar. A entrada de Fripp e sua preparação na introdução gira num misto de suspense e dramaticidade, todos os movimentos meticulosamente calculados. 'Introductory Soundscape' se processa apenas com o líder no palco, executando notas extremamente atmosféricas, na linha da sua parceria com Eno.

Os outros três integrantes entram no palco em meio a este baita clima e a voz robótica de Adrian Belew enuncia 'The Power To Believe I: (A Cappella)', já temos a senha para o repertório neurótico e quebrado do grande King Crimson. O grupo mostra um entrosamento ímpar e o processo de comunicação é perfeito, o destaque dessa parte introdutória com 'Level Five' fica a cargo da simbiose entre os solos de Robert Fripp e o baixo incendiário de Trey Gunn. 'ProzaKc Blues' é a música perfeita para os exercícios vocais de Adrian Belew, que além de cantar, dança que é uma barbaridade e sola demais sua guitarra.

'The ConstruKction Of Light' é uma das músicas que mais admiro dessa fase crimsoniana, principalmente pelos timbres das guitarras que lembram teclados e o incrível dedidalho de Fripp com a paleta indo em praticamente todas as cordas com uma velocidade incrível, os vocais de Belew são mais suaves. Masteloto apresenta a habitual categoria com quebras de tempo e variações de intensidade de ampla categora, interessante a postura de Trey Gunn que nessa faixa toca o baixo na mesa, como se fosse teclados, um bando de feras para delírio dos japoneses que aplaudem entusiasmados a performance do grupo. 'Happy With What You Have To Be Happy With' é uma música menor do grupo e pouco inspirada, passa sem maiores atrativos.

'Elektrik' apresenta o arsenal de experimentalismos do grupo, excelente set instrumental com destaque para o jogo de pratos de Masteloto que casam muito bem com a guitarra de Belew e seus diversos solos. 'One Time' é daquelas músicas que funcionam como anticlímax, ainda mais depois da pauleira instrumental que o grupo imprimiu no número anterior, belíssimos vocais de Belew que sabe dosar agressividade e sentimento de forma equilibrada, aqui é só sentimento, lembrando alguns números do velho Crimson na condução de Greg Lake, tais como 'Epitah'.

'Facts Of Life', 'The Power To Believe II (Power Circle)' e 'Dangerous Curves' perfazem um espaço introspectivo na apresentação do grupo, com diversos efeitos eletrônicos, espaciais e psicodélicos, numa viagem impressionante. A precisão e técnica de Fripp na execução das notas na guitarra é uma aula, o solo ao final deste set instrumental beira o absurdo de tanta velocidade. A emendada com 'Larks' Tongues In Aspic: Part IV' é propícia para o encaminhamento final, há de se destacar a batera categórica de Mastelotto, num misto de Bruford e Muir, realizando os diversos sons nos instrumentos percusivos com muita propriedade e criatividade. O solo de Trey Gunn no baixo disposto na horizontal é um dos melhores momentos do show, muito feeling, lembrando um jardineiro podando os locais mais complicados em torno dos lambris onde as trepadeiras tanto gostam de estar. Não por acaso fora extremamente aplaudido ao fim deste momento pungente.

O bis termina com 'The Deception Of The Thrush' sem trazer muita novidade com relação à versão de estúdio, funcionando como elemento propício para as pirotecnias de Belew na guitarra. Resta apenas relatar que o público oriental aplaudiu intensamente o quarteto. Os extras desse primeiro disco são econômicos, mostrando trechos das apresentações no Japão, intitulados 'Indiscretion I', 'Indiscretion II' e 'Indiscretion III', com destaques para o inusitado duelo de guitarras na primeira parte e um momento da execução de 'Eyes Wide Open'. A seguir o dvd II traz-nos a turnê do 'The Construcktion Of Light' com uma apresentação no Shepherds Bush Empire em Londres.

Adrian Belew surge dando as cartas com 'Into The Frying Pan' arrebentando nas guitarras. Em seguida a música tema da turnê conduzida por uma linha de baixo assustadora executada pelo formidável Trey Gunn. A versão é mais extensa que a do dvd I e também mais vibrante, hipnotizando o público londrino.

A neurose pesada do grupo toma forma com 'VROOM', após Belew perguntar à platéia como estavam as coisas naquela noite. A impassibilidade de Fripp que mal se movimenta realça a completa diferença de postura de palco para o dançante Belew, esse inusitado entrosamento da dupla funciona perfeitamente, pois praticamente surgem execuções perfeitas, Fripp com seu total poder de concentração na erra absolutamente nada. 'On Time' aporta no palco provando que é a grande balada dessa formação, a interpretação de Belew como sempre é hiper pungente! Na sequencia o primeiro set de improviso (algo que fica ausente no primeiro dvd) com 'Blasticus SS Blastica'. Diante do psicodelismo intenso do grupo através de diversos efeitos fica visível a referência à primeira fase do Pink Floyd, inclusive os timbres de guitarra do Fripp são idênticos aos utilizados por Barret em 'Interstellar Overdrive'. O maior destaque fica por conta das viradas de Mastelotto, afinal de contas toda a condução desses experimentos, inclusive alguns efeitos eletrônicos estão a seu cargo, tocando bateria de forma intensa e muito criativa, provando porque é considerado uma fera no meio.

A introdução e a paradinha de 'Dinosaur' levanta o público, pois se trata de uma música muito admirada pelos fãs do Crimson. 'The World's My Oyster Soup Kitchen Floor Wax Museum' é mais um daqueles rocks desvairados que Belew tanto gosta de compor e tocar, aqui ele é o rei! Na sequencia mais cinco minutos com o segundo set de improvisos intitulado 'C Blasticum', com destaques novamente para os efeitos percusivos de Pat Mastelotto.

Em 'Cage', Belew assume os violões e Fripp de forma impressionante toca teclados na guitarra, o timbre que ele cria é fantástico, elaborando bases ousadas para o vocalista. Adrian não consegue conter sua satisfação com sorrisos a todo instante para o mestre Fripp, a harmonia entre ambos é extremamente equilibrada. 'ProzaKc Blues' e 'Lark's Tongue In Aspic Part IV' possuem execuções semelhantes às contidas no primeiro disco com o show no Japão.

Na volta para o bis Adrian Belew executa um dos melhores números dessa fase, a climática 'Three Of A Perfect Pair', numa versão acústica e solo, tendo ao fundo o coral do público britânico, criando uma mágica aproximação entre platéia e artista. 'The Deception Of The Thrush' assim como no Japão também aporta no bis, com uma interessante introdução sob condução de Mastelotto e seus milhares de efeitos. Destaque também para o baixo 'falante' de Trey Gunn que cria uma base propícia para o cerebral solo de Fripp, intricadíssimo, bem ao seu estilo por fugir completamente do usual. Após uma pausa para os aplausos, a banda engrena com a zappiana 'Sex, Sleep, Eat, Drink, Dream', onde sem dúvida temos um dos grandes momentos de toda a apresentação. Os solos de Fripp beiram o absurdo, agilidade, técnica e precisão impressionantes, o mestre não come nem engasga uma nota sequer para o delírio do público que ainda estava empolgadíssimo e com fôlego para solicitar a presença dos músicos novamente no palco, a insistência foi tanta que não teve jeito, em atendimento a tantos apelos, o King Crimson fez ainda uma última execução, rememorando 'Heroes'.

Desnecessário dizer que se trata de item obrigatório para qualquer amante da obra do Crimson, principalmente aqueles que curtem essa fase surgida a partir dos anos oitenta. Entretanto, para que essa obra atingisse de fato a perfeição necessitaria da execução de ao menos uma faixa da fase setentista da banda, uma apenas pra matar as saudades, para levar todos ao êxtase completo. É praticamente surreal que um grupo com uma discografia tão clássica e robusta se recuse por completo a trazer-nos alguns momentos, mesmo que efêmeros, daquela época majestosa. Acho que 'Starless' iria casar perfeitamente com a interpretação de Belew, mas... Outra curiosidade é que ao final do espetáculo a um quê de Roberto Carlos que achei muito simpático da parte de Belew, mas não revelarei aqui, deixo a curiosidade reprimida para os privilegiados que ainda irão assistir a este dvd.

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