Aksak Maboul

Belgica

Titulo: Un Peu De L'Ame Des Bandits
Ano de Lançamento: 1979
Gênero:
Gravadora: Label n�o informado
Número de catálogo:
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  Revisto por: Gibran Felippe Nota:9.5
Obra-prima, irretoc�vel.

Um dos grupos mais aclamados do movimento RIO, o belga Aksak Maboul abusou do diletantismo neste segundo trabalho. A concep��o original em forma de duo, do disco de estr�ia, 'Onze Danses Pour Combattre La Migraine', foi alterada significativamente com a inclus�o de um time de not�veis, onde o prazer de realizar sua pr�pria m�sica bate muito mais forte do que propriamente a necessidade de atender aos apelos comerciais da m�dia, gravadoras e p�blico.

'Un Peu De L'�me Des Bandits' � composto pelo fundador e multi-instrumentista Marc Hollander (a mente criativa do Aksak Maboul) - �rg�o, piano, clarinete, saxofone, xilofone e percuss�o, Michel Berckmans - contrabaixo e obo�, Denis Van Hecke - violoncelo, Catherine Jauniaux - voz, Frank Wuyts - teclados, Chris Cutler - bateria e Fred Frith - baixo e guitarra. Estas figuras foram os respons�veis por entregar uma m�sica que a princ�pio pode parecer algo lun�tico, algo esquizofr�nico, algo sem sentido, mas em audi��es acuradas se percebe que os ingredientes originais e criativos, bem como o primor t�cnico s�o a t�nica do �lbum, trabalho que definitivamente n�o deve ser consumido de qualquer forma, a qualquer modo e por ouvintes despreparados para o impacto de toda essa desconstru��o musical.

Antes de analisarmos as m�sicas, vale ressaltar a presen�a sempre marcante dos eminentes m�sicos ingleses do movimento RIO, Fred Frith e Chris Cutler. J� na primeira faixa, 'A Modern Lesson', percebe-se a base de guitarra do mestre Frith, criando o pano de fundo necess�rio para as mais diversas piruetas dos outros integrantes. O atonalismo predomina, os vocais de Catherine Jauniaux beira o bizarro, confundindo-se com as notas de clarinete e sax. Aten��o para o movimento final, provavelmente o �nico em que se percebe alguma melodia, entremeada com in�meros efeitos sonoros do xilofone, piano, percuss�o e at� espa�o para uma m�quina de pinball a banda permite. Mesmo com o sax de Hollander criando uma melodia interessante, o azougue de todo o grupo n�o permite sequer uma repeti��o da melodia por parte do saxofonista, dessa forma, a fuga completa do lugar comum fica consumada! Cart�o de visitas melhor n�o h�, a sonoridade desarm�nica do primeiro n�mero com a inclus�o de um vocal sui generis, completamente fora dos padr�es, causa o efeito necess�rio para prender a aten��o dos ouvintes que apreciam o estilo do grupo at� o fim da obra, principalmente porque o improv�vel toma forma. 'Palmiers En Pots' possui dois movimentos relacionados � cultura Argentina, a beleza do piano unida � melancolia do violino impressiona, a melodia aflora como poucas vezes observamos em bandas sinf�nicas, logo fica percept�vel o completo dom�nio dos m�sicos sobre a m�sica, capazes de se aventurar em qualquer seara sonora, provando que a escolha musical pelo RIO � legitima, de fato aquilo que os instiga, o minimalismo autoral.

Ap�s o momento de suavidade, o grupo emenda numa composi��o de Frith altamente nervosa, 'Geistige Nacht', com solos de sax absolutamente enlouquecedores a cargo do genial Marc Hollander. A bateria tamb�m merece destaque, quebrando com categoria impressionante o tempo inteiro. Denis Van Hecke d� o tom na ar�bica 'I Viaggi Formano La Giovent�', tanto pelos vocais quanto pelo violoncelo hipn�tico t�pico da musicalidade do Egito e Oriente M�dio, daquelas que costuma fazer a naja subir no cesto, mas aqui n�o h� flauta, mas uma combina��o do pr�prio violoncelo com o maravilhoso obo� de Michel Berckmans e o sintetizador de Wuyts, a percuss�o de Hollander tamb�m � bem interessante, vale ainda citar o coral feminino n�o creditado, ou provavelmente criado nos synths.

O maior gracejo do grupo chega na condu��o de 'Inoculating Rabies', faixa neur�tica com uma base de punk rock conduzida por Van Hecke e Frith, no seu �nico minuto o grupo apresenta um certo deboche com essa cena musical que havia dominado o planeta na ocasi�o. Ap�s esse interl�dio, o Aksak Maboul apresenta o melhor momento de sua discografia, a su�te 'Cinema', dividida em quatro movimentos completamente distintos, cada qual mais instigante que o outro. � poss�vel tra�ar algumas similaridades dos belgas com outros nomes de peso no cen�rio RIO, notadamente Henry Cow, Univers Zero e C�s, mas ao ouvir a referida su�te, torna-se n�tido que o grupo desenvolveu sua concep��o de forma extremamente original e �nica. O primeiro trecho de 'Cinema' surge em meio a uma total abstra��o, a condu��o do contrabaixo e do sax tenor remetem aos cl�ssicos filmes de suspense dos anos sessenta, tais como aqueles dirigidos pelo mestre Alfred Hitchcock, caracter�stica que alude ao t�tulo da su�te. A percuss�o de Chris Cutler � muito inspirada, assim como os mais diversos efeitos produzidos por Wuyts, os �ltimos dois minutos desta parte s�o de arrepiar, com um sincronismo b�rbaro entre os mais variados instrumentos, lembrando a quebradeira e vibra��o do King Crimson, fase 'Islands'. O minimalismo continua no segundo movimento, em forma de m�sica de c�mara, a bateria descansa, enquanto o obo�, clarinete, sax e xilofone continuam conduzindo a pequena orquestra inusitada do Aksak Maboul. O terceiro movimento � o de maior destaque, com uma consist�ncia na cozinha meio roqueira, em que Marc Hollander prova de fato ser uma fera, demonstrando grande habilidade, e acima de tudo sagacidade na condu��o de um leque farto de instrumentos: �rg�o, piano (bel�ssimo), clarinete, sax, xilofone, al�m da execu��o de todas as percuss�es constantes nesse movimento intitulado 'Azinou Crapules'. A curiosidade fica pela participa��o nos arranjos do seu companheiro no trabalho de estr�ia - Vincent Kenis.

A edi��o da Crammed Discs ainda traz um b�nus contendo m�sicos da forma��o original, inclusive Vincent Kenis no baixo e a vocalista V�ronique Vincet. A m�sica 'Bosses De Crosses' � quase convencional perto do que se acaba de ouvir durante a execu��o do �lbum. N�mero ao vivo que vale um pouco mais que a simples curiosidade. N�o se pode deixar de citar o trabalho art�stico da capa, extremamente bizarra e agressiva, provavelmente com essa capa o disco n�o deve ter sido muito bem aceito na hip�crita Am�rica! Melhor capa pra descrever uma obra de RIO � dif�cil, at� nisso vemo-nos obrigados a aplaudir a aud�cia dos belgas.

'Un Peu De L'�me Des Bandits' impressiona por apresentar in�meras facetas sem a menor coes�o, atingindo o �pice da filosofia RIO, n�o por acaso trata-se de um dos mais incensados trabalhos do estilo, onde v�rios elementos antag�nicos se chocam, desde o bizarro, obscuro, psicod�lico, eletr�nico, m�sica de c�mara, tango, jazz, blues, rock b�sico, punk, m�sica �rabe/oriental/�tnica, progressivo, at� as mais diversas refer�ncias Thelonious Monk, Robert Wyatt, Duke Ellington, Nino Rota, Eric Dolphy, Kraftwerk e Frederic Ravel.

Absolutamente essencial para se entender a evolu��o do RIO e fundamental para todos os admiradores do estilo!