Marillion |
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Revisto por: Gibran Felippe | Nota:10.0 |
"So here I am once more in the playground of the broken hearts..." Aqui estamos tratando de um autêntico clássico do rock progressivo, com todos os elementos pertinentes a essa definição – polêmico, arrebatador, vigoroso, instigante, pioneiro e sobretudo corajoso. Temos outros atributos: músicas bem elaboradas, longos solos de guitarra, profusão de teclados, letras inspiradíssimas e um quinteto muito bem entrosado com relação à sua proposta musical. Enfim, um divisor de águas por motivos que ainda relataremos nessa resenha e teve a grande capacidade de mexer com praticamente todo o público progressivo. Provavelmente a maior virtude desse primeiro trabalho do Marillion está no fato de ninguém permanecer alheio durante o seu lançamento: quer gostem, quer odeiem, o recado chegou ao destino com êxito e a bem da verdade é que a maioria se regozija com "Script For A Jester's Tear" em sua aparelhagem de som e de preferência num volume generoso. Tido com um dos pontos de partida para o movimento conhecido como neo prog, ainda continua sendo um dos melhores do gênero, mesmo vinte e cinco anos depois. Vou mais além, pois imagino ser essa jóia o melhor trabalho da banda e um dos dez melhores álbuns de toda a década de oitenta. Ao meu ver, item essencial em qualquer boa estante de cds, aliás, todos os trabalhos com Fish são muito atraentes. Após sua saída, infelizmente o Marillion seguiu ladeira abaixo e ficou extremamente irregular. Isso é um pouco estranho, pois para muitos o Marillion se assemelha à sonoridade do Genesis devido justamente à presença do vocalista e a semelhança do seu timbre com o de Peter Gabriel. A sua saída representou um distanciamento com relação à essa característica, que muitas línguas maldosas resolveram intitular de clone genesiano, logo, era de se esperar que a banda adquirisse mais consistência, aproveitasse essa saída, adquirindo mais originalidade e vigor em sua sonoridade e arranjo, mas de fato isso não ocorreu e o que realmente interessa no Marillion, ao menos para a maioria, é de fato a fase Fish iniciada por esse genial "Script For Jester's Tear". O álbum traz uma das maiores formações do movimento neo: Derek Dick (o popular Fish) nos vocais, Steve Rothery guitarras e violões, Peter Trewavas no baixo, Mark Kelly teclados e fechando com Michael Pointer na bateria. Logo na primeira música, percebemos o quão sentimental é a guitarra de Rothery, combinando inteiramente com a emoção dramática imposta por Fish, o solo final com os vocais ao fundo é extasiante, grande movimento! Não temos como abordar esse primeiro trabalho do Marillion e não citar novamente o Genesis, mas fica a questão: a banda é um simples clone do Genesis? Apesar da influência latente do medalhão setentista, diria que o Marillion não se satisfez apenas recriando toda a atmosfera e climas do Genesis, é fato que inúmeras bandas fizeram isso com relativo sucesso no meio e surpreendente boa vendagem. Um caso muito particular que posso citar é o do grupo Citizen Cain, essa sim, suga tudo e mais um pouco do Genesis, chega a ser maçante em vários momentos, mas os seguidores de Tony Banks e cia. não se importam e apreciam bastante esses autênticos sequazes genesianos. No caso do Marillion, o que mais se assemelha são os timbres de Fish, nos momentos mais suaves são praticamente idênticos aos de Peter Gabriel, mesmo que a estrutura sonora seja posta de forma bem mais moderna e nem um pouco datada, essa semelhança vem a tona com muita força, de qualquer forma a sua alternância entre sentimentalismo e agressividade também o aproxima de forma muita apropriada a outro monstro – Peter Hammill, basta anlisarmos duas músicas: "The Undercover Man" do Van Der Graaf Generator e "Script For A Jester's Tear", as variações vocais em ambas são muito próximas, iniciando-se de forma suave e melancólica, até atingir o ápice da agressividade. Fish é um caso a parte e merece uma atenção especial, está longe de tratar a música com frieza. É um dos artistas mais expressivos e sentimentais surgidos após os anos 70, passando-nos com extrema capacidade toda a emoção que suas composições despertam, acima de tudo um declamador de verdadeiras poesias. Praticamente um polígrafo capaz de discorrer sobre diversos temas com muita propriedade e interpretações convincentes, um mestre na arte da expressão vocal, visual e gestual. Nos anos oitenta o progressivo estava relegado a um segundo plano, diante da explosão de outros gêneros. Nesse aspecto a importância do lançamento dessa obra tornou-se ainda mais fundamental, justamente por iluminar o fim do túnel nesse período. Sim, o Marillion portou a lanterna, sendo uma das mais preponderantes referências a trazer novamente o estilo peculiar do rock progressivo à tona... as artes visuais espetaculares, temas como depressão, vida no isolamento e até lapsos de insanidade diante de frustrações. A dualidade esperança x melancolia permeia a obra, traços já abordados por outros grandes como Pink Floyd, Van Der Graaf Generator e Eloy. Os arroubos melódicos existentes na obra ficam a cargo da maravilhosa guitarra de Steve Rothery, capaz de apresentar uma sensação de alívio e alento após o movimento mais forte de "Forgotten Sons", música que trata da guerrilha na Irlanda, onde a libertação através de atos violentos sobrepuja até mesmo a questão ideológica e que posteriormente deu nome à banda portuguesa de relativo sucesso no movimento progressivo dos anos 90. Sem dúvidas, ao lado da música de abertura é o carro chefe do álbum e a música que mais se distancia da concepção sonora genesiana e talvez a geradora da base de um estilo próprio – isso mesmo, em termos de Marillion, essa música é o ponto de abertura do movimento neo como viríamos a travar contato para uma definição autêntica. Consideram como ponto fraco desse trabalho a bateria de Mike Pointer, que em determinados momentos soa um tanto burocrática, principalmente se comparamos com o estilo do seu sucessor, Ian Mosley, que fora mais técnico e versátil nos álbuns posteriores. De qualquer forma, faz-se necessário frisar que Pointer não compromete o trabalho em momento algum, a sua bateria é elegante e requintada e tempos depois, nos anos 90, provou através de sua performance no Arena, tratar-se de um grande baterista, fazendo bem mais do que havia produzido no Marillion. O frescor da musicalidade do Marillion nos anos 80 possui muito da atmosfera new wave, porém enquanto a maioria das bandas desse movimento possuíam uma conotação acima de tudo pop, apesar do ambiente meio dark, o Marillion centrava seu som em algo progressivo, sem no entanto ficar simplesmente copiando as bandas dos anos 70, a semelhança com o Genesis está muito mais ligada à questão dos vocais que propriamente ambientação e arranjo sonoro. Por esse motivo revitalizou todo o movimento progressivo tradicional, sendo rotulado de neo e se distanciando basicamente de medalhões como Genesis e Pink Floyd, arregimentando uma jovem legião de fãs, capazes de ouvir e adquirir numa coleção de lps, sem grandes problemas, bandas como Iron Maiden, The Cure, New Order e naturalmente o Marillion, mesmo que essa juventude não tivesse tanta sintonia com os dinossauros setentistas. Volto a frisar a questão da importância do lançamento desse disco, já que o mesmo está ligada à própria sobrevivência do estilo progressivo, onde provou-se que popularidade e qualidade ainda podiam estender as mãos após o fim da década anterior, sem soar datado ou como uma sessão de naftalina, em que pese a mídia nessa ocasião estar infestada pela cultura punk. Em proporção menor, nos anos 90 algumas bandas conseguiram o feito de fazer progressivo e arrebanhar um público jovem, sem parecer datadas, entre elas podemos citar o Flower Kings, Spock's Beard e Finisterre, todas obtiveram boa margem de vendas ao redor do mundo, até mesmo fora do meio progressivo. "Script For A Jester's Tear" é um trabalho conceitual, em que o personagem central é abordado com a dose certa de dramaticidade nos vocais de Fish, retratando seu remorso inicial e posteriores arroubos de loucura, sendo acompanhado por uma guitarra muito inspirada de Rothery, capaz de acompanhar essas alternâncias com rara perfeição, fazendo-nos rememorar os melhores tempos de suas principais influências: Steve Hackett, David Gilmour e Andy Latimer. Contou ainda com a colaboração expressiva de Mark Kelly que foi mestre em criar atmosferas nos teclados para a entrada dos solos de guitarra. A curiosidade final fica por conta da origem da alcunha de Fish; existem duas versões: a primeira e mais insólita é que se deve à sua admiração pela obra "Fish Out Of The Water" do yesman Chris Squire, de tanto ouví-la nos anos setenta ele resolveu se batizar com o apelido de Fish e a segunda é que quando criança a brincandeira que mais o divertia era na banheira de sua casa. Por passar horas se divertindo dessa forma, passaram a chamá-lo de Fish. |